quarta-feira, 16 de março de 2016

Quem é esse?

Que pés são esses?
Pés com pele e carne rasgadas e ossos quebrados. Ensanguentados, empoeirados, com as unhas por fazer, com a sola endurecida de tanto andar por todo o tipo de solo. Pés que nunca traíram o seu dono e sempre o levaram ao lugar certo. Pés que pisaram a cabeça da serpente e que sustentam o peso do meu pecado, pois, “o castigo que me traz a paz estava sobre ele”.
Que pernas são essas?
Pernas que caminharam os mundos, resolutas, à procura da dracma perdida, da ovelha perdida. Incansáveis, jamais retrocederam, jamais vacilaram, jamais bambearam mesmo com o peso dos mundos sobre elas. Quando se dobraram foi para ajoelharem-se diante Daquele, único, que lhe era maior.
Que corpo é esse?
Corpo desgastado, cansado, ferido, com um lado rasgado e de onde sai uma água que me lava, me restaura, me mantém vivo. Rasgado, assim como o véu que separava foi rasgado com seu último suspiro, permitindo aos homens acessarem o trono do Altíssimo, agora já não há mais “os preferidos, os escolhidos”. Esse corpo rasgado é um véu. Quem passar por ele entenderá a vida, verá Deus e acessará a eternidade.     
Que braços são esses?
Nunca fechados, sempre, sempre abraçando, acolhendo, sobretudo, os desvalidos, os discriminados, os párias, os renegados, os desqualificados, os “marginais”, os doentes, os pecadores, os dispensáveis, os irremediáveis, os pobres. Tratando-os, no seu compasso, sem julgá-los, sem condená-los, mas tratando-os.
Que mãos são essas?
Mãos curadoras, apaziguadoras, poderosas, e, sobretudo, abençoadoras. Rasgadas também, é verdade, mas abençoadoras, e que imprimem em mim o anseio de progredir, prosperar da condição de abençoado para a de abençoar, que “maior ventura há em dar do que em receber”. Mãos que repartem o pão, pois que sua existência consistiu em repartir. O milagre da multiplicação foi provocado pela divisão, no que dividiu, multiplicou. Mãos que jamais estiveram fechadas, sempre abertas, que apoiam, consolam, acalmam, assim como arregimentam, indicam, apontam que caminho seguir. Mãos semeadoras das melhores sementes. Mãos que tratam o solo, arando-o, preparando-o, adubando-o para produzirem em profusão.
Mãos que pintam as mais belas paisagens, que esculpem as mais belas esculturas, que compõem as mais belas canções, pois que “tudo foi feito por Ele e para Ele”.
Que cabeça é essa?
Ensanguentada, coroada sim, não com o vil metal, desfigurada mas com olhos que me penetram a alma e extraem de mim o que sou na real. Impossível ficar alheio, impassível diante desse olhar, pois que também expressa cumplicidade em qualquer situação, sem, contudo, compactuar com aquilo que em mim há de mais negativo. Um olhar sereno, mas determinado, silencioso, mas eloquente, interrogativo, mas responsivo. Um olhar capaz de me levar às mais altas instâncias da vida. Um olhar seguro de quem sabe o que é, de onde veio e para onde vai, consciente da missão cumprida e a cumprir. Um olhar de quem sabe ter todas as respostas, e que a seu tempo serão apresentadas. 
Com uma boca sem igual, sem par, que proferiu as mais sábias palavras, eternas e eternizantes, apaziguadoras, palavras que põem em polvorosa os sábios e os entendidos, os poetas e os profetas, os filósofos e os teólogos, e demais.
Boca que exala o verbo, que é mais do que a junção de algumas letras e sons, mas a própria personificação do Divino. Boca que exala o sopro divino e que leva vida a todos os recônditos da alma.

Boca que jamais teve sua voz elevada, pois que inquestionável, pois que... Ele é. Ponto.