quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O tempo e as jabuticabas



Texto de Rubem Alves
Filósofo, teólogo, psicanalista, professor, escritor e... poeta

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui pra frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de jabuticabas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas, percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturas.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral.
As pessoas não debatem conteúdo, apenas os rótulos.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.
Quero a essência. Minha alma tem pressa.  
Sem muitas jabuticabas na bacia quero viver ao lado de gente humana, muito humana.
Que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com seus triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
O essencial faz a vida valer à pena.
E para mim basta o essencial!

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