sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Teologia de Calçada: Sacerdócio Levítico x Sacerdócio Melquisedequeano - Parte 4/4

Parte 4/4

Sacerdócio Melquisedequeano

Diz o livro santo, em inefável inspiração, que o Cristo é O Sumo Sacerdote, aquele que intercede pelos seus. Que ele é o sacerdote e o sacrifício, tendo oferecido um único e suficiente sacrifício. Ele sim está entre Deus e os homens, só ele e mais ninguém, na condição exclusiva de mediador.
Ele é o modelo. Ele é o padrão. Ele liberta da matéria. Já não se precisa mais de arca da aliança, de shofar, candelabro de 7 velas, de estolas sacerdotais, de vestuários próprios, de templos físicos, de elementos transubstanciáveis, de dinheiro, de rituais, de relíquias, de liturgias pretensamente abridoras do acesso ao alto, de objetos de qualquer natureza ou de mediador humano.
Por que Melquisedequeano?
A referência é a Melquisedeque, um rei sacerdote sem genealogia, sem começo nem fim de dia e que em um encontro com Abraão trouxe pão e vinho, mesmos elementos usados pelo Cristo na última ceia.
É sabido que Jesus era judeu, e judeu da tribo de Judá, assim como Davi, seu ancestral. Como judeu da tribo de Judá ele não poderia ser sacerdote, conforme exposto acima que somente os pertencentes à tribo de Levi poderiam ser sacerdotes.
Mas a bíblia afirma que Jesus era sacerdote.
O livro harmoniza a situação esclarecendo que Ele era sacerdote não segundo a ordem levítica, mas segundo a ordem de Melquisedeque, uma ordem superior a dos levitas, pois diz o livro santo que os levitas, na pessoa de Abraão, deram ofertas a Melquisedeque e foram abençoados por este, logo, se “o maior abençoa o menor”, aqui temos o sacerdócio levítico sendo abençoado pelo sacerdócio melquisedequeano, demonstrando que lhe é superior.
É espetacular, mas não surpreendente que Jesus seja sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque.
Diz o livro santo que Jesus elevou seus seguidores à condição de reis e sacerdotes, ou seja, segundo o livro em outro trecho, um sacerdócio real, condição que o sacerdócio nos modelos apresentados anteriormente não foi capaz, tanto não foi capaz que o rei Saul atuou como sacerdote e perdeu o reinado por isso.
Atenção: o termo “rei” aqui não referencia o conceito musical/ideológico/filosófico da versão gospel do termo. O missivista já renegou o movimento, pois que, dentre outros, o movimento reivindica inapelavelmente posicionar-se sempre como “cabeça” jamais como “cauda” numa exegese tendenciosa de determinado trecho da escritura.
Aqui já não há uma casta, uma elite, um grupo de pessoas que seriam representantes de Dxus, de autoridades que se postam sobre os demais como que os comandando e dominando, as chamadas “coberturas”.
O eco reverbera bem alto desde antanho aos dias dessa graça, repercutindo que “entre vós não será assim”.
Como Melquisedeque, que não teve nem princípio nem fim de dias, como o vento que sopra onde quer, assim esses sacerdotes estão à mercê do comando do Espírito Santo, fazendo o que bem Lhe aprouver, cujo trabalho não está mais circunscrito a lugares, títulos, ascendências, objetos, músicas, dinheiro. Aqui os sacerdotes são adoradores 24 horas por dia, não no templo, não quando cantando, não quando ministrando, mas no trabalho, no descanso, na intimidade do leito sagrado e do lar. Um ambiente em que ninguém é mestre, ninguém é pai (exceção óbvia feita à progenitura), ninguém é guia, pois que o Cristo proibiu que se tratasse o outro assim, conforme Mateus.
Nesse sacerdócio o emocional não prevalece sobre o racional, nem vice-versa. Esses sacerdotes são treinados para aplicarem um e outro no seu tempo adequado, como adequado é o conceito quem têm de si, nem com a auto-estima exacerbada, nem como vítimas de falsa modéstia, nem como triunfalistas, nem como usuários da autocomiseração. Sem clichês, sem discurso e vocabulário formatados, sem resposta pronta pra tudo, sem apontar de dedos.
E quanto ao discipulamento, o que há, então? Como ele ocorre?
Há compartilhamento, muito compartilhamento. De irmãos mais velhos, já talhados, muitas vezes na bigorna, já experimentados, muitas vezes na crise, já escaldados, muitas vezes no isolamento, já provados e aprovados, muitas vezes no estreito. Contudo, compartilhamento invariavelmente sob uma relação no nível horizontal, sem ascendência, sem preferências, sem prerrogativas especiais, sem destaque, sem poderes humanos autoritários/despóticos/pernósticos.
O sacerdócio melquisedequeano é a quintessência da relação humana, pois que extrapola, transcende as relações terrenas, elevando-as a um nível superior. Aqui não há lugar para a cultura patriarcal do machismo, tampouco para a cultura revanchista do feminismo. Aqui não há lugar para disputas por posições, por domínio, por vantagens.
Nesse sacerdócio as barreiras caem, todas elas. Ninguém é considerado pelo poder financeiro ou intelectual, pela cor dos olhos ou da pele, pelo cabelo liso ou crespo, pela silhueta esguia ou não, pelo peso ou pela altura, pelo IPTU ou pelo IPVA que paga.
Grandeza das grandezas, aqui ninguém é tratado como igual, que ninguém é igual a ninguém. Do pedreiro ao engenheiro, do lixeiro ao empresário, do aluno ao professor, da ovelha ao pastor, do homem à mulher, do rico ao pobre, do preto ao branco, cada um é cada um, com suas idiossincrasias, e, em suas individualidades, cada um é tratado com o devido respeito que merece como ser humano, como filho de Deus e como sacerdote, com a equidade devida e com a possibilidade de ação, ministração, compartilhamento e ensino aberta a todos num ambiente sem distinções, sem disputas, sem comparações.    
O sacerdócio melquisedequeano é o cumprimento da cruz, a conclusão da obra de Deus. Por esse sacerdócio o mundo pode ser resgatado, pois que o Cristo brilha, o Cristo fala, o Cristo cura, o Cristo salva, o Cristo media, o Cristo É, como o Pai É, como o Espírito Santo É.
“O brilho desse mundo se apaga ante ti, a glória dessa terra nada é”.   
O sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque rasgou o véu. Véu que separava as pessoas da presença santa. Véu que é a sua carne (há um mistério aqui). Sim, quando ele teve o seu corpo rasgado pela lança do soldado, o véu do templo se rasgou sem ação humana. 
Como o véu se rasgou, o sacerdócio levítico, bem como os seus sucedâneos findaram, pois eram tão somente sombras da realidade, e o homem pode agora entrar o impenetrável e falar diretamente com o Magnânimo, sem a necessidade da intervenção e mediação humanas.
O sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque fala com o homem, em sua inteireza, em sua completude, em sua condição, seja ela qual for. Ele o alcança na alma, no espírito e no corpo, ou seja, esse sacerdote não deixa o homem passando fome nem sede, de nenhum tipo, ainda que ele esteja doente, preso, nu ou seja forasteiro (ou imigrante), conforme Mateus.

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